quinta-feira, 29 de outubro de 2009

la marseillaise

la marseillaise

a um canto alguém cantarola la marseillaise

não vejo de onde vem o som indignado,
mas o distingo bem
contra a tirania, me solidarizo em qualquer lugar

empunho também minhas armas e forjo meus batalhões:
todas as palavras se enfileiram e tentam dar sentidos à vida,
se insurgem contra o discurso vazio

‘sentido’ é o que buscamos
porque você, assim como eu, [e nisso somos um]
não acreditamos na sedução, no canto das palavras

no entanto
em algum canto,
alguém há que ainda confie

e cante

segunda-feira, 12 de outubro de 2009


infância

ao relento
uma esperança
dorme

invento
uma nova criança
tento

relembro
aprisionada em tantas questões
rio com lágrimas

não tenho urgência em responder
estou acostumada a esperar
e não acredito na pressa

como convém, falarei
quem vive ou passa por aqui,
já viu os castelos na areia

ou mesmo já os fez, de um jeito ou de outro

quem nunca construiu castelos de areia, ah!
que coloque a primeira pedra e materialize alguma obra

qualquer uma,
digna do homem
e do seu trabalho

qualquer uma, desde que perene

qualquer uma,
ainda que intangível
mas que possa dizer:

rio de janeiro
rio de fevereiro
e rio de março

rio da chuva
impiedosa e brutal

rio das águas
sobre as quais
a cidade se fundou

rio com sal
rio com mar
o rio dos rios

pedacinhos
da cidade fragmentada
miríades de imagens
em mais um outubro a desafiar o rio...


domingo, 16 de agosto de 2009

sobre o outro...

de Davi Bogomoletz

"Quando nos relacionamos com um outro ser humano sem essa dimensão de perplexidade,
sem esse sentimento de estranheza,
sem nos darmos conta de que estamos diante de algo grande demais para conhecermos inteiramente,
nesse momento estamos nos relacionando com uma 'coisa', não com um 'ser'.
Quando queremos que esse outro seja como nós o concebemos,
esquecemo-nos de levar em conta que ele é como é (mesmo que ele próprio nunca saiba como é),
e o transformamos em coisa.
Quando alguém evita pensar e formular as próprias opiniões, adotando as de outro, transforma a si mesmo em coisa."

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

o tempo?



o tempo? quem dera...
vamos ver:

levanto cedo, vezes demais cansada
resmungo um pouco, somente um pouco
o mau humor não me veste.

no automático, preparo o café
e como um mantra recito
“café com pão, café com pão, café...”
quase o suficiente pra me deixar feliz,
mas não só –
- meus três amores aqui dormem.

cada corpo adormecido que vou olhar e cobrir
(faz um pouquinho frio, cedinho é inverno no rio de janeiro),
sorri e ressona em seu sonho de dias melhores.

hoje não foi diferente, ouvi o despertador
[como sempre, desde sempre
pensei em todas as rimas com or],
me soltei dos braços do meu amor
e ainda olhos fechados entoei o meu louvor.

pensei no tempo, tomara que dê!
que faça bom tempo, que seja ameno
valem todos os sentidos
amém!

na primeira página do jornal dia desses,
o sol negro, um dos mais longos eclipses deste século,
cobria a meia-lua lá pelos lados do continente asiático,
tão distante de nós...

ah! a felicidade dessa bela efeméride
e logo refiz as pazes com o cansaço de mais uma jornada

mas o tempo, claro,
é o que interessa
terá mesmo faltado?

em todos os meus relógios
tantos são por aqui
vejo o tempo o tempo todo
e por pouco, esbarro no coelho branco e apressado
de alice no país das maravilhas
a correr atrás do tal do tempo...

não, não sonhei
apesar da lua quase cheia

o que vi faltar
foram braços e pernas
e vontades e desejos

o tempo é presente
a escolha será futuro

domingo, 2 de agosto de 2009

pra quem é pai, pra quem é mãe, pra quem se importa

http://www.youtube.com/watch?v=RQ6n3t9sFBs

quarta-feira, 15 de julho de 2009

las cosas



¨Las cosas no son dificiles de hacer, lo dificil es colocarnos en estado de hacerlas¨.

Constantin Brancusi

domingo, 12 de julho de 2009

não sou



não sou

fato consumado
objeto de consumo
pau pra toda obra

mas não choro pitangas
pé de boi
passo o pente fino
entro com o pé direito

sem eira nem beira
fico a ver navios
durmo no ponto
e deixo o dito pelo não dito...

domingo, 5 de julho de 2009

a tua benção

abra meus olhos
para que eu possa
levantar o rosto

guarda-me
para que eu possa
estender as mãos

faça resplandecer teu conhecimento
para que eu possa
ter sabedoria

e se não for
querer demais
peço também a tua paz

quinta-feira, 2 de julho de 2009

libelo - josé régio

Libelo
José Régio, Antologia Poética


Por caminhos só rectos, não sei ir.
Nos ínvios por que vou, não sei ficar.
Suspenso do passado e do porvir,
Venho e vou!, venho e vou!, não sei parar,

Abri asas nas mãos para fugir,
E raízes nos pés para amarrar.
(Levava chão nos pés indo a subir,
Trazia céu nas mãos vindo a baixar...)

Eis, porém, que estes dons ultra-humanizam,
E os homens, meus irmãos, se escandalizam
E me espontam as asas e as raízes.

Assim se castram eles próprios, pobres!,
E tendo-se, mais vis, por mais felizes,
Se satisfazem com seus magros cobres...

quinta-feira, 25 de junho de 2009